domingo, 29 de janeiro de 2012

"O que é ser um kodansha?"

Emeri Pacheco Mota Junior

Quando iniciei o treinamento de Judô, nos idos 1970, tinha a idéia de que o faixa-preta de artes marciais era o expoente máximo de sua arte, invencível em uma luta, conhecedor de técnicas infalíveis e secretas, homem a ser temido e admirado.
Naquela época era possível contar nos dedos das mãos os faixas-pretas de Judô, pessoas às quais tinha todo o respeito e consideração, não só pela qualidade de iniciante que éramos, mas, principalmente, pela postura e comportamento ético que visualizava naqueles professores, preocupados não somente em nos tornar campeões, mas também em transmitir os valores maiores das artes marciais.
Após algum tempo de treinamento, acentuado o interesse pelo Judô e por outras artes marciais que cheguei a praticar, busquei ler e pesquisar sobre o assunto, oportunidade em que descobri que existia alguma coisa além da famosa faixa-preta.
Descobri que a faixa-preta não era o destino final do praticante de Judô. Ao chegar nesse estágio, o praticante ainda necessitava evoluir e essa evolução não se referia somente a realizar as técnicas da arte com cada vez mais proficiência. Essa maturação que o praticante da arte haveria de passar, tinha como pressuposto a necessidade de uma evolução integral, cumprindo um processo em direção aos melhores objetivos almejados pelo nosso Mestre Jigoro Kano.
Descobri que existiam os Dans e que após o quinto Dan, o praticante passaria a envergar na sua cintura uma faixa de cor diferente, primeiramente vermelha e branca, e depois toda vermelha, passando a ser denominado então de Kodansha – O Representante do Kodokan.
Naquela época, na minha ingenuidade de iniciante, entendi que esse sim seria o lutador verdadeiramente invencível. Aquele que chegou ao ápice do conhecimento do Judô, detentor de toda técnica do seu estilo de luta, o verdadeiro mestre.
E os anos foram passando, de forma que somente em 1982, na Academia Nacional de Polícia, em Brasília, como aluno do Curso de Formação Profissional, tive a satisfação de conhecer um kodansha pela primeira vez, o Sensei Gunji Matsuushi, tendo a honra de ser seu aluno.
Daquele momento em diante, tive a oportunidade de conhecer muitos outros kodanshas através de cursos e treinamentos que participei, podendo citar os senseis Suga, Suganuma, Odair Borges, Matsuda, Shiozawa, Miura e, em especial, Massao e Luiz Shinohara, tendo por estes últimos especial carinho em considerando a atenção e cordialidade que sempre nos foram dispensadas durante os treinamentos que realizamos na Academia da Vila Sônia. De forma igualmente destacada, não poderia deixar de citar o sensei Takashi Haguihara, pela convivência, amizade e ensinamentos que recebemos constantemente.
Hoje passados quase quarenta anos desde que coloquei os pés pela primeira vez em um dojô, muitos conceitos foram evoluindo e se transformando ao longo desse tempo. Como citado, conviví com vários kodanshas e o que mais ficou marcado nesses relacionamentos, a despeito do que seria inicialmente esperado, não foi o aspecto técnico desses professores, mas, sim, a postura e o comportamento ético e profissional que sempre identifiquei como o diferencial em cada um deles.
No ano passado fui agraciado com a graduação de 6º Dan em Judô, conforme indicação da Comissão de Grau da LJDFE, o que me trouxe alegria e satisfação, recebendo essa comenda como reconhecimento pelos esforços despendidos em prol da nossa nobre arte, entretanto, senti no íntimo o grau da maior responsabilidade que assumi daqui para frente. O conceito do lutador invencível, conhecedor de todas as técnicas foi há muito por água abaixo. Verifiquei naquele momento que muito ainda tenho que aprender e evoluir, e que, felizmente, não cheguei ao fim da jornada.
O aprendizado contínuo tem mostrado que um kodansha deve ser sinônimo de equilíbrio, um dos fundamentos maiores da nossa arte, o qual deve ser utilizado não somente no ambiente do dojô, mas em todas as situações em que seja necessário, principalmente no relacionamento com nossos semelhantes.
Um kodansha deve não somente aparentar, mas desenvolver de forma sincera um comportamento ético, moral e profissional adequado à posição que ocupa.
Exemplificando, tomamos a liberdade de transcrever alguns trechos de um artigo de autoria do professor Osvaldo Ichikawa (SP), kodansha, 8º Dan:
“Um Kodansha deve ser respeitado pelo que ele é e pelo que ele
representa em qualquer situação, seja discursando, dando aulas,
cursos, palestras ou simplesmente assistindo uma competição.”
“Nós difusores do Judô não podemos deixar que valores fundamentais
como respeito, humildade e hierarquia entre outros se percam.”
“É imperdoável que um kodansha não saiba o significado
do termo “Shihan”. Quando falamos em kodanshas,
logo vem a idéia de pessoas com alto grau de conhecimento
dentro do judô, mas, às vezes, não é isso que acontece.”
Hoje tenho a firme convicção que para ser um kodansha o judoca deve, dentre outros atributos, possuir um alto grau de conhecimento da arte, mas, antes de tudo, ter humildade para continuar seu aprendizado; apresentar comportamentos ético, moral e profissional ilibados; além do compromisso diário com a difusão e ensino do Judô, repassando os fundamentos formativos da nossa arte, tornando-se exemplo de valor para aqueles que o sucederão.
Exemplificando, acredito que todos considerariam execrável o comportamento de um atleta derrotado de forma limpa e honesta no shiaijo, que fosse tirar satisfações com o atleta vitorioso fora do ginásio da competição, apenas por inconformismo pessoal com o resultado.
O que se falar, então, se esse comportamento fosse advindo de um kodansha?
Emeri Pacheco Mota JuniorVice-Presidente da LJDFE
Kodansha - 6º Dan

FONTE: http://www.judobrasil.com.br/2008/divulg194.htm



sampaio dojô

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